Do Brasil, envio saudações a todos os foristas! Peço escusas por não me expressar em seu idioma, mas (“pero”) penso que é melhor o bom português que um espanhol mal escrito. Ademais, nossas línguas são bastante assemelhadas, e, se acaso não me fizer entender, estarei feliz em tentar esclarecer qualquer dúvida. Li seus últimos comentários e tenho algumas considerações a fazer.
Aparentemente, o jornal (“periódico”) publicou uma estimativa muito elevada. Contudo, há que se ter em conta que esse tipo de falha é comum no discurso jornalístico, frequentemente impreciso. Também é preciso considerar que o preço de um quebra-gelos depende muito das dimensões, da capacidade operacional e do reforço do casco do navio (“buque”). Vejamos alguns exemplos:
- a Austrália substituirá o Aurora Australis a um custo de A$ 1 mil milhões (equivalentes, aproximadamente, a US$ 760 milhões), incluídos os valores de construção e de manutenção ao longo de toda a sua vida útil (considerando-se apenas a construção, estima-se um valor de A$ 500 milhões). Trata-se, todavia, de um navio de 23.800t, com um projeto customizado para as necessidades da AAD (Australian Antarctic Division), com hangar para três helicópteros e casco mais reforçado do que o do atual navio.
- O Reino Unido, que possui três quebra-gelos (HMS Protector, da Royal Navy, e James Clark Ross e Ernest Shackleton, da BAS – British Antarctic Survey) deverá construir, também até 2019, mais um quebra-gelos, a um custo de £ 200 milhões (equivalentes a US$ 280 milhões). Comenta-se que o novo navio substituirá os dois da BAS, pois o JCR é de 1991 (bastante usado, para os padrões europeus) e o Shackleton, na realidade, é arrendado da Noruega e será devolvido em 2019. Não foram obtidos dados sobre seu deslocamento, mas sua capacidade polar será superior à dos dois navios da BAS. O trabalho será feito pelo estaleiro Cammel Laird.
- A França também substituirá o L’Astrolabe, por um quebra-gelos com o mesmo nome, com capacidade de carga de apenas 1.200t, a ser construído pelo estaleiro Piriou até 2017 (o casco será de responsabilidade da polonesa CRIST), a um custo de € 50 milhões.
- A China construirá, com meios próprios, um segundo quebra-gelos (já possui o Xue Long). O novo navio deslocará 8.000t, e se espera que esteja concluído ainda neste ano. Como tudo o que envolve a China, é difícil se obter maiores informações, especialmente quanto aos custos. Sabe-se que o projeto foi desenvolvido pela finlandesa Aker.
- O Chile pretende substituir o envelhecido Almirante Viel, de 1965, por um novo quebra-gelos de deslocamento muito superior (13.000t), a ser entregue em 2021, com projeto da Vard e a ser construído no estaleiro chileno Asmar, a um custo de US$ 120 milhões.
Como se vê, o preço de um navio quebra-gelos é bastante variável. O próprio Irízar, que já está há quase dez anos parado, custará muito mais do que se poderia ter imaginado inicialmente. Tudo depende de planejamento, e parece que o Brasil ainda está longe de ter a Antártida como prioridade. No entanto, sempre fomos capazes de abastecer nossa estação, com meios próprios – o Brasil nunca precisou arrendar ou solicitar empréstimo de navios e tampouco de aviões ou helicópteros de países estrangeiros.
Além disso, o país desenvolve atividades no interior do continente, como é o caso do módulo automatizado Criosfera 1, a 670 km do Pólo Sul, que recebe visitas anuais de cientistas brasileiros, para manutenção. Para o ano que vem está prevista a instalação do Criosfera 2, a cerca de 800km do outro módulo (nesses casos, a logística é contratada da empresa ANI – antiga ALE). Em um futuro não muito distante, o Brasil deverá ter uma segunda estação, no continente, e necessitará de um quebra-gelos para acessá-la e abastecê-la.
Quanto ao Programa Antártico Brasileiro (Proantar) depender da ARA, não há qualquer verdade nisso. O Proantar depende, e muito, mas do Chile: os dois navios polares brasileiros (Almirante Maximiano e Ary Rongel) partem de Punta Arenas, e a FAB utiliza o aeroporto Marsh, na base Frei. Por outro lado, por força do espírito de cooperação que impera nas atividades antárticas, também outros países, como França, Portugal e o próprio Chile, se servem dos meios disponibilizados pelo Brasil.
Quero destacar que desejo muito que a Argentina assuma o lugar que é seu por direito no continente antártico: trata-se do país de mais longa presença ininterrupta (nas Órcadas desde 1904), e com a mais vasta rede de bases (6 permanentes e 7 de verão) no local, e que vem sendo desde há muito sabotado pelo Reino Unido, tanto na reivindicação britânica sobre o continente austral, que contém toda a pretensão argentina e boa parte da chilena, quanto na questão das ilhas Malvinas, das Sandwich do Sul e das Geórgias do Sul. Mirem-se no exemplo chileno, que transformou Punta Arenas em um centro logístico de importância ainda superior à de Hobart (AUS), Christchurch (NZE) e Cidade do Cabo (AFS), graças à presença do aeródromo Marsh na Ilha Rei Jorge, saturada de estações de pesquisa. Se a Argentina realmente conseguir posicionar Petrel como uma alternativa, somada a Marambio, é possível que Ushuaia ganhe muito peso no contexto antártico. Com as limitações impostas pelo Tratado Antártico, a capacidade de cooperação e a importância logística se convertem em ganhos políticos e fortalecem suas pretensões.